Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Conhecimento Hoje

Conhecimento Hoje

Papa Martinho I: o mártir da ortodoxia na luta contra o monotelismo

O Papa Martinho I governou a Igreja de 21 de julho de 649 até 17 de junho de 653, sucedendo a Teodoro I. O seu pontificado ficou marcado pela defesa intransigente da ortodoxia contra a heresia monotelita, pela realização do Concílio de Latrão e pelo seu martírio nas mãos do imperador bizantino Constante II, tornando-se o último papa a ser venerado como mártir.

Apr13PopeSaintMartinI1.jpg

Nascido por volta do ano 600 em Todi, na região da Úmbria, Itália, Martinho I tinha uma formação sólida em teologia e direito canónico. Antes de se tornar papa, serviu como apocrisiário (embaixador) em Constantinopla, o que lhe proporcionou um conhecimento profundo da política e das tensões religiosas do Império Bizantino. A sua experiência diplomática e o seu compromisso com a fé ortodoxa tornaram-no a escolha natural para suceder a Teodoro I, num momento em que a Igreja enfrentava uma das suas mais graves crises doutrinárias.

O principal desafio do seu pontificado foi a controvérsia do monotelismo. Esta doutrina, apoiada pelos imperadores bizantinos, afirmava que Jesus Cristo tinha apenas uma vontade divina, em vez de duas vontades (divina e humana), contrariando a definição do Concílio de Calcedónia (451). O imperador Constante II, na tentativa de encerrar o debate, emitiu em 648 um decreto chamado Typos, que proibia qualquer discussão sobre o número de vontades em Cristo.

Recusando-se a aceitar a interferência imperial em assuntos doutrinários, Martinho I convocou o Concílio de Latrão em outubro de 649, sem a aprovação do imperador – um ato ousado que desafiava diretamente a autoridade bizantina. Este sínodo reuniu cerca de 105 bispos, principalmente do Ocidente, e condenou de forma categórica o monotelismo, rejeitando tanto a Ekthesis (decreto de Heráclio) quanto o Typos de Constante II. O concílio reafirmou a fé calcedoniana de que Cristo possuía duas vontades distintas, uma divina e outra humana, em perfeita harmonia.

A resposta do imperador não demorou. Irritado com a atitude do papa, Constante II ordenou a prisão de Martinho I, acusando-o de traição e usurpação de poder religioso. Em junho de 653, o exarca de Ravena, representante imperial na Itália, prendeu o papa em Latrão e enviou-o a Constantinopla.

A viagem para o Oriente foi marcada por humilhações e privações. Quando chegou a Constantinopla em setembro de 654, Martinho I foi julgado num processo-farsa, onde foi acusado de conspirar contra o imperador. Apesar do seu estado de saúde debilitado, foi condenado ao exílio em Quérson, na Crimeia (atual Ucrânia), um lugar remoto e inóspito.

As condições no exílio foram brutais. Enfraquecido pela fome, frio e doença, Martinho I escreveu cartas comoventes aos seus seguidores em Roma, lamentando o abandono em que se encontrava e a falta de apoio do clero ocidental. Morreu a 16 de setembro de 655, em total solidão e sofrimento, tornando-se o último papa a ser reconhecido como mártir pela Igreja Católica.

Apesar da sua morte trágica, o legado de Martinho I perdurou. A sua firmeza em defender a fé ortodoxa fortaleceu a posição de Roma como guardiã da doutrina cristã contra as interferências políticas. A heresia monotelita foi finalmente condenada pelo Terceiro Concílio de Constantinopla em 680-681, confirmando a posição defendida por Martinho I.

O Papa Martinho I foi canonizado e é venerado como santo tanto pela Igreja Católica como pela Igreja Ortodoxa. A sua memória é celebrada a 13 de abril, e o seu exemplo de coragem, fidelidade e sacrifício continua a inspirar a Igreja até aos dias de hoje.